Cumprido o segundo dia de percurso, o norte já ficou bem atrás. Trás-os-Montes e as Beiras, Alta e Baixa, foram ultrapassadas num par de jornadas, que trouxeram a caravana do Passeio Portugal Norte-Sul até ao Alto Alentejo. Restam atravessar duas regiões: o Baixo Alentejo, com as suas planícies, e o Algarve, que será abordado pelas serranias. O Clube Land Rover de Portugal anuncia um percurso tranquilo para o dia final. E promete ainda uma dose reforçada de paisagens, avisando que ninguém terá dificuldades em chegar a Vilamoura…
O Passeio Portugal Norte-Sul desceu nesta sexta-feira da Beira Baixa até ao Alto Alentejo. E na jornada que levou a caravana de Castelo Branco a Reguengos de Monsaraz, só não completou o percurso quem não o quis mesmo fazer; ao contrário do que aconteceu no primeiro dia, em que somente meia-dúzia de participantes conseguiu cumprir todo o itinerário!
A elevada distância, “mais até do que os 300 quilómetros anunciados”, assegurou-nos Cátia Mateus, fez do primeiro dia uma maratona. E como o percurso era quase todo por caminhos de terra, alternando estradões rolantes com trilhos duros, vencê-lo na integra obrigou a grande disciplina. Ou, por outras palavras, implicou manter um bom ritmo de andamento durante toda a jornada. Mas foi esse o desafio do grupo onde se insere Cátia Mateus, o único que pode realmente contar o que viu a cada metro deste Passeio Portugal Norte-Sul. Porque as outras 23 equipas não viram tudo; só uma parte, grande, em muitos casos, pouca ou até quase nada, noutros casos.
O dilema de sempre: preguiça ou acção?
Fora da estrada, uma boa média de andamento, anda pelos 30 km/h. Acima disso, o ritmo já não é o de passeio, mas sim de corrida. E a distância da etapa inicial obrigava a um compromisso entre os dois ritmos: para que fosse possível não abreviar caminho para terminar a tempo de jantar, era fundamental andar bem e parar pouco. Como se os participantes fossem confrontados com um dilema, entre a preguiça e a acção?
No nosso caso, claramente que preguiçámos, com incontáveis paragens, umas para apreciar demoradamente as paisagens, outras até para um café, para dois ou três deles. Mas a maior paragem foi para uma reparação. E já em Castelo Branco, quando percebemos que não percorremos senão cerca de dois terços do percurso, ficámos com uma sensação de perda. Porque por muito que conheçamos este Portugal maravilhoso, sobretudo pelas perspectivas únicas que só se revelam nestes caminhos, nunca conheceremos tudo.
Quatro cafés e pão de ló caseiro…
E a curiosidade por conhecer o que já não chegámos a percorrer, fez-nos encarar o segundo dia com mais empenho. Nós e praticamente todos os participantes. É certo que o percurso não era tão longo, o que tornou mais fácil a tarefa de cumprir integralmente o itinerário. Não deixámos de parar para tomar café. Por quatro vezes! Numa delas até fomos brindados com uma fatia de pão de ló que veio de Rio Maior para alegrar-nos a gula; e mais caseiro e saboroso não podia ser, amarelo de tantos ovos que leva, e fofo, quase esponjoso, como se exige de um pão de ló.
O bolo, generosamente partilhado pelo grupo que na véspera deu o exemplo, ao pôr-nos a pensar que merece a pena um esforço para cumprir todo o percurso, foi-nos oferecido em Castelo de Vide. Na segunda paragem, a que ninguém se furtou, ou não fosse o ponto onde podíamos recolher o pacote com o “almoço”. E escreve-mo-lo entre aspas porque só não lhe chamámos lanche, porque o comemos à hora do almoço.
Na primeira dose de café, oferecida também pelo Clube Land Rover de Portugal, fomos dos poucos que pararam junto ao cais fluvial de Vila Velha do Ródão. Na terceira, arrependemo-nos por não ter parado mais cedo no Restaurante O Álvaro, em Urra. Porque sacrifício foi não termos acompanhado uns companheiros de viagem nos petiscos que os fizeram sentar-se à mesa desta casa afamada, não muito longe de Portalegre.
Sandes de presunto para aconchegar e mini para refrescar
A sanduíche de queijo e fiambre que fez de conta do almoço rapidamente deixou de sentir-se no estômago. E desde a Serra de São Mamede às planícies além de Portalegre, Monforte e Barbacena, os caminhos admiráveis que percorremos alimentaram-nos tudo menos o estômago. Por isso, já depois de avistarmos o Guadiana pela primeira vez neste passeio, sentimos o apelo de um reclame luminoso onde se lia: Café!
Estávamos na Mina do Bugalho, pequena aldeia onde os habitantes mais velhos dizem que nem os avós alguma vez viram a mina a laborar. Diziam sim, era que em tempos se explorou volfrâmio e cobre. E nós pedimos uma mini para refrescar, e uma sanduíche de presunto, meio rançoso e servida em pão duro, que partilhámos com a Marta. Ela, a gata, que já é avó, como nos contou a dona do café, ainda tinha mais fome que nós, pois até as migalhas lambeu do meio da calçada. E lambeu-se mesmo com uns farripos de presunto que lhe atirámos.
Mais reconfortados, arrancámos em direcção ao Rosário e surpreendemos um pequeno grupo de Land Rovers, parados à sombra de uma enorme azinheira. Eram os carros do grupo que Frederico Gomes, o Presidente do Clube Land Rover de Portugal, tinha felicitado por terem cumprido todo o percurso. Havia ali petisco, na certa. E também repuseram energias, porque rapidamente nos alcançaram.
Na cauda da caravana desde a partida até à chegada!
Talvez não sejamos os recordistas em paragens, da caravana que integra o Passeio Portugal Norte-Sul. Mas grande parte das nossas paragens devem-se à constante recolha de imagens. Para mais tarde recordar, como dizia o slogan da Kodak, em tempos que já lá vão. No entanto, enquanto no primeiro dia nunca recuperámos o atraso das paragens, nesta segunda etapa toda a gente, talvez mesmo sem excepção, atrasou-se. E as constantes paragens do nossos companheiros de caminho permitiram sempre que os alcançássemos.
A paragem final para mais uma dose de café, servida pelo “barista” da organização, o incansável Rui Teixeira, ofereceu-nos a oportunidade de mais um desses reagrupamentos. Mas quando chegámos ao adro da ermida de Nossa Senhora das Neves, perdida num cabeço a sul da foz da ribeira de Lucefécit, toda a gente partiu. E lá percorremos solitariamente o último troço do percurso, passando por Montejuntos sem pararmos em nenhum dos quatro cafés. Embora os quatro cafés desta pequena aldeia se situem em frente uns dos outros, junto ao cruzamento principal, a clientela que se acumulava à porta mostrava que o negócio dá para todos!
A dureza do caminho até à Herdade do Roncanito já nos é familiar há décadas. E rolámos, como sempre, devagar, para evitar quer furar pneus, pois o caminho é revestido por pedras, quer para que o Range Rover não se desmontasse. Ainda bem que o fizemos, porque cruzamo-nos de frente com um grupo de “motards”, num treino de final de tarde; não fossemos cautelosos e podia ter sido mais do que um susto. Podia ter sido um acidente…
Celebrar a jornada à mesa, com migas e carne de porco
Confessamos aqui que atalhámos a subida a Monsaraz, para uma passagem pela vila. Porque já assistimos ao pôr do sol no caminho em direcção a Reguengos de Monsaraz. E é óbvio que chegámos de novo de noite. Mas, desta feita, desfrutámos plenamente do percurso traçado pelo Clube Land Rover de Portugal. E se o norte já ficou bem atrás, também o sul vai adiantado. O último reagrupamento da segunda jornada foi sentados à mesa, diante de um prato de migas com carne de porco do alguidar.
E antes de uma fatia de bolo rançoso, o “briefing” para a etapa final não podia ter sido mais breve: “O percurso em todo terreno termina com uma descida acentuada, na serra de Espinhaço de Cão. Tem muita pedra e quem não tiver bons pneus, deve descer por um caminho alternativo” – avisou Frederico Gomes. E acreditamos que o aviso é para levar a sério…
Texto e fotos: Alexandre Correia
por: Albano Loureiro